Saturday, August 23, 2003

11.


Olho de peixe.
O olho de peixe olha o vazio.
“Olha-me.”
Olha. Negro. Morto.
No mercado.
Uns desalinhados, outros a monte, os peixes olham, focando o infinito, olham as notas e moedas que lhes passam por cima. As mãos tocam-se e o dinheiro passa.
Olhou o olho do peixe. Por detrás do olho, negro, está o peixe. Morto.
Uma criança chora. Perto. Olhou os olhos da menina.
“Os olhos dos peixes não choram. Ou choram?”
Afastou-se.
“Há qualquer coisa de sábio na escuridão dos olhos dos peixes. Mortos. Há uma luz…negra. Que sabem eles?”
Aproximou-se doutra banca.
“Vieram do mar. Há mar e mar, há ir e voltar… Que sabem eles da morte?”
Quis saber: olhou um olho de peixe. O olho do peixe.
“Vai-se. Mas da morte não se volta, palerma.”
De repente chegou um cheiro desagradável. Como um arrepio na nuca ressuscitou-lhe os sentidos.
“Queres experimentar a morte enquanto ainda experimentas a vida… És um parvalhão!”
Foi-se embora.